Outros gêneros musicais podem fazer maior sucesso comercial hoje em dia. Entretanto, poucos definem a chamada cultura brasileira tão bem quanto o samba. Por bem ou por mal, é ele quem ficou atrelado a nossa identidade como brasileiros. Mas por que isso? Afinal, como o surgiu o samba e por que ele nos influencia assim?
Navegar nessa questão acaba por surgir como algo mais complexo do que levantar a história de um estilo musical popular. Significa também adentrar na formação de uma cultura que envolve tradição e modernidade. E, assim, entender como essa cultura particular agregou para o todo de uma construção nacional.
É o que veremos neste texto que traz à tona as origens do samba. Aqui teremos uma breve história do gênero e sua importância como um fenômeno cultural. E, enfim, como o samba afetou o que entendemos por cultura brasileira.
O samba como uma tradição
Quando se fala em samba vez ou outra ouvimos expressões como “samba de raiz” ou “tradição do samba” aparecendo. Mas quando se fala em como surgiu o samba essas expressões acabam levando a entendimentos errados. Portanto, vamos entender melhor o que se pode chamar de raiz do samba.
Semente da diáspora africana
Muito se escuta sobre o samba ser uma música afro-brasileira. Isso quer dizer que os elementos do gênero provêm da chamada diáspora africana. Ou seja, da chegada histórica de africanos escravizados para as Américas. No caso do Brasil, das culturas bantos e iorubás desde a colonização portuguesa até a Lei Eusébio de Queiroz.
A perda de raízes proporcionada pela escravidão com o diálogo cultural no solo brasileiro foi que desaguou no surgimento do samba. A percussão e as celebrações de origem banto se mesclaram com elementos culturais dos iorubás. Uma semente do samba que germinou conforme foi sendo alimentada com elementos culturais de negros, brancos e indígenas.
Uma batucada característica
Certamente o elemento que define o samba em suas origens e em sua evolução é sua polirritmia própria. O que quer dizer que exibe uma diversidade na precursão que uma variedade de expressões rítmicas. Pela teoria musical ocidental, essa polirritmia costuma ser chamada de síncope.
Mas outros pesquisadores, como o brasileiro Carlos Sandroni, defendem que surge de uma lógica musical própria. É o que chama de tresillo, um paradigma rítmico de oito pulsações assimétricas. Esse ritmo único de raiz africana afetou não só o samba como a música das américas em geral.
Não só um samba, mas sambas
Se deve ter em mente que as raízes do samba levaram a diversas manifestações do gênero independentes entre si. Suas variações em geral têm ligação com a região onde surgem. Mas também dos diferentes instrumentos rítmicos usados em cada um. Maranhão, Pernambuco, Bahia, São Paulo e Rio de Janeiro têm tradições próprias do samba.
Mas o samba que ficou famoso como tal vem de uma ligação inter-regional. Mais propriamente do êxodo de negros baianos para o Rio de Janeiro. Essa população trouxe a tradição do samba do recôncavo, tocado por instrumentos como o atabaque, o reco-reco e o agogô. Essa raiz mais o contato urbano criam o que seria o samba moderno.
O samba se moderniza
A vitória do samba surge pela sua capacidade de se readaptar e reinventar conforme tempo e espaço. Não foi diferente com a modernização do país onde o samba se converteu na música desse novo paradigma. De como surgiu o samba vamos olhar como passou da tradição de celebrações para a música de massa do Brasil.
Na sala de visitas
O laboratório para a primeira transformação moderna do samba foi nos arredores da Praça Onze. No começo do século XX, esse foi o espaço onde surgiu uma vibrante classe média negra dentre os baianos emigrados. As residências ao redor da praça experimentaram uma curiosa sincronia entre espaço privado e público.
A mais famosa dessas residências foi a de Hilária Batista de Almeida, a Tia Ciata. Ali se encontravam os maiores músicos da comunidade como Donga, João da Bahiana e Pixinguinha. Mas mesmo membros da elite intelectual e burocrática carioca também apreciam, superando assim barreiras raciais.
A primeira gravação
É comum a afirmação de que samba “nasceu” com a gravação de Pelo Telefone, composição de Donga, pelo cantor Baiano. Isso no ano de 1917. Um ponto controverso sobre como surgiu o samba, pois há registros de outras gravações da mesma época ou anteriores identificadas como samba.
Na verdade, mesmo atribuição dessa composição a Donga é polêmica. Afinal, o que o sambista fez foi reunir vários cantos populares que reverberavam na casa de Tia Ciata. Ainda assim, se considera mérito de Donga ter dado os motivos para contar a história do samba na imaginação popular.
Do morro para as Escolas
Mas a modernização definitiva do samba se deu nos morros do Rio de Janeiro. Mais especificamente no bairro de Estácio de Sá que operou uma revolução no gênero. Foi aí que se modificou a polirritmia, a deixando ainda mais complexa. Também mudou a percussão, levando o tamborim, o surdo e a cuíca para o samba.
O maior nome dessa mudança foi o do compositor Ismael Silva. Ele modificou assim o samba para uma forma canção mais própria ao consumo de massas. Também foi o idealizador da primeira escola de samba, a Estácio. Deu assim origem à cultura comunitária espetacular que tornou famosos nomes como Mangueira, Portela e Salgueiro.
A diversidade do samba
Da tradição do recôncavo até as escolas dos morros, o samba passou por muitas modificações. Foi graças a essa capacidade de metamorfose que virou uma música representativa da brasilidade. Assim, para falar sobre como surgiu o samba precisamos falar sobre seus subgêneros.
Samba de Enredo
Ismael Silva e o Estácio deram origem as escolas de samba, assim como do moderno carnaval carioca. Mas a origem da canção característica dos desfiles das escolas é outra. Antes do surgimento do samba de enredo, as escolas desfilavam com uma sequência de sambas preparados de antemão.
Cabe o crédito a Simas de Oliveira a invenção do samba de enredo como um subgênero. Ele imaginou uma composição de samba com andamento longo e lírica de inspiração épica para ser cantada nos desfiles. Algo que levou para sua escola, a Império Serrano. Simas também é compositor de clássicos do gênero, como Aquarela Brasileira.
Samba Canção
Talvez um dos subgêneros mais radiofônicos do samba. Fez bastante sucesso na década de 50 ao combinar o samba com orquestrações. Também dialogava com outros ritmos então na moda, como o bolero. Mas sua principal característica são as letras recheadas de melancolia e tragédia.
O samba canção assim atraiu uma diversidade de compositores importantes do gênero. Nomes como Cartola, Ary Barroso, Dorival Caymmi e Herivelto Martins foram ativos compositores de samba canção. Também foi através do samba canção que Tom Jobim experimentou harmonias mais complexas, originando a Bossa Nova.
Pagode romântico
O pagode romântico recolocou o samba nas mais tocadas dos rádios dos anos 90. Também trouxeram a modificação mais profunda do samba desde a revolução da Estácio. Arriscavam com instrumentos diferentes dos tradicionais, como o banjo, o repique e o tantã. Também incorporavam sons eletrônicos, irritando os puristas.
Os grupos de pagodes românticos também modificaram o centro do samba, sendo focados em São Paulo. Aproximaram assim o samba da MTV com seu teor adocicado e bem-humorado. Também fizeram o contato do samba com outros gêneros da moda, como o rap.
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Fontes: Wikipedia – Carlos Sandroni – Scielo
Imagem: Wikimedia commons
